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Para além da guerra comercial, o risco da incompetência

O ano de 2018, segundo dados do Banco de Portugal, pode representar o regresso do PIB português a nível de 2008 – uma “década perdida”, conclui-se. Década esta que não é só reflexo do profundo impacto da crise económica e financeira; ela representa também a parca recuperação em curso e, em certa medida, o atraso da economia portuguesa face à Europa: a zona Euro, por comparação, recuperou o nível de PIB de 2008 em 2014. Quatro anos antes, portanto. O que nos deveria fazer refletir; reorientar prioridades e reorganizar o nosso modelo. Mas, não: insistimos na navegação à vista.

Internacionalizar hoje

Muito se poderia escrever sobre estes lentos anos da nossa economia – reformas estruturais adiadas, avanços e recuos nas tímidas opções estratégicas do país, dependência externa e subserviência a interesses internamente instalados, derivas à esquerda e à direita; em suma, a falta de desígnio nacional que nos motive e oriente.

Todavia, estas linhas prendem-se mais com o futuro. Sendo certo que não há futuro sem memória, uma das lições da crise revela-se na alteração do perfil do comércio externo português. Dos 30% em 2008, o peso das exportações no PIB subirá para cerca de 45% em 2019. Mais satisfatório é que as importações, ainda que acompanhando a subida, não tiveram um movimento tão pronunciado, permitindo um reequilíbrio da balança comercial, agora excedentária.

Mais, o Banco de Portugal prevê a manutenção deste excedente comercial em torno de 2% nos próximos anos, o que permitirá um excedente externo na casa de 1% do PIB. Ora, em termos macroeconómicos esta é uma condição para que o país possa ir reduzindo o elevado nível de endividamento externo.

Ganhar desafios nos mercados externos

Aqui chegados, é por demais evidente uma velha, mas sempre atual, constatação sobre a competitividade de uma economia pequena e aberta como a nossa: o sucesso mede-se na capacidade de ganhar desafios nos mercados externos. Através da incorporação crescente de valor nacional, o desenvolvimento – leia-se a melhoria do bem-estar – está intimamente ligado à afirmação das nossas empresas nos negócios internacionais.

A internacionalização das empresas portuguesas deve, portanto, constituir um autêntico desígnio nacional, para o qual concorrem a capacidade de pensar global, de perceber as dinâmicas dos mercados, preferencialmente os mais sofisticados onde reside maior poder de compra, de competir através de inovação diferenciadora, de mudar a vocação e a atitude empresariais. Ainda que, tudo isto e em muitos casos, implique mudar o ADN das empresas portuguesas, sobretudo nas de menor dimensão.

A guerra pelo talento

Com uma dura guerra comercial no horizonte a gerar crescente incerteza, sobretudo a escalada do protecionismo e consequente redução do comércio internacional que afetará as previsões de crescimento, como podemos alimentar esta onda positiva de afirmação do comércio externo português?

Do contacto próximo percebe-se que, mais do que incentivos e financiamento – na sua medida importantes –, é de capital humano que as empresas estão mais carentes.

De talento orientado para abraçar os desafios do comércio e investimento internacionais, atuando num mundo em constante transformação.

Líderes empreendedores e criativos; ágeis e ambiciosos decisores. Gestores determinados na mudança, flexíveis na gestão da incerteza e do risco, e capazes de cooperar e estabelecer parcerias.

Marketers com sólidos conhecimentos internacionais – são tão poucos no nosso país! –, do business intelligence à gestão internacional de marca, da transformação digital à agilidade negocial, do comércio eletrónico às complexas operações em mercados cada vez mais interconectados.

Gestores comerciais que dominem os distintos contextos e dinâmicas dos mercados, que estejam familiarizados com práticas e instrumentos de nova geração, facilitadores de tomada de decisão célere e informada, mais suportada em business analyticsdo que em intuição.

Técnicos de diversa ordem capazes de lidar com termos e práticas de comércio internacional, de gerir riscos, de projetar comunicação e imagem, de ativar relação e presença nos mercados, sobressaindo a capacidade de comunicação e de relacionamento interpessoal: do domínio de idiomas e de ferramentas digitais à crucial empatia.

Este desafio monumental, requer uma resposta cabal do ensino profissional e superior português, que tem sido “duro de rins” na sua transformação. Serão cursos especializados, exigentes e com visão de futuro que permitirão tanto a afirmação de jovens profissionais capazes de abraçar novas competências quanto a requalificação de profissionais experientes que necessitam reorientar o enfoque estratégico da sua atuação. Se a resistência à mudança das clássicas é maior, devem ser as escolas de negócio mais dinâmicas a dar resposta pronta e cabal.

Luís Ferreira, co-founder Birds & Trees

Artigo de Opinião publicado no semanário "Vida Económica"

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